sexta-feira, 24 de abril de 2009

O conceito contemporâneo de família (?)

É muito triste ler nos jornais e saber por amigos que existem famílias coniventes com uma mãe que deixa de falar com a filha por recalque ou porque desistiu de tentar uma aproximação; um pai que pune seu filho de 12 anos com uma forte agressão física e verbal, só porque a criança o contrariou; famílias que permitem que uma filha sofra abuso sexual; ou ainda saber que um pai chama de "favorzinho" a preocupação e a entrega de um filho que largou tudo para vê-lo, enquanto este se consumia por um AVC em outra cidade, na noite de Ano Novo. A família de hoje não é mais a mesma cantada por Arnaldo Antunes em 1986. Isso porque além de não almoçar junta todo dia, não se tolera mais, não atravessa um problema de mãos dadas, nem transmite palavras de incentivo e apoio quando um de seus membros desesperadamente precisa.

Parece que "individualismo" e "egoismo" são sinônimos contemporâneos encontrados para a tradicional palavra "família". Pode-se dizer que o ápice da comprovação dessa minha teoria foi ouvir um filho expressar a vontade de mudar seu sobrenome com o intuito de se dissociar, definitivamente, da família. É inacreditável como muitos ainda desprezam a importância de fortalecer esses laços permanentes, isso porque, segundo especialistas o distanciamento familiar é tão grave que acaba por gerar consequências desastrosas na formação do indivíduo como um todo. Foi comprovado que muitos adultos se tornam mimados, psicóticos, alienados e/ou frustrados por serem criados em ambientes nocivos, não somente por terem herdado gens pouco confiáveis. Deixando de lado a questão negativa da coisa, um fato é certo: nesse caso, a exceção deve ser aplaudida de pé e reconhecida, mesmo que não seja pela família, que seja por amigos, namorados e desconhecidos.

Afirmo com propriedade quando digo que vale a pena conhecer uma pessoa assim... que mesmo diante de uma provável conspiração do universo contra sua formação psicológica saudável, descarta a possibilidade de auto-piedade e opta por reagir, dando a volta por cima e lutando contra um fim óbvio demais. A meu ver, essas pessoas são muito mais especiais do que aquelas cuja família pode contar. Você que é ou conhece alguém assim, sabe que chega a ser assustador olhar nos olhos dessa pessoa e ver, nitidamente, a força (não só de vontade!) que há dentro dela. Saber que mesmo com tudo tramado contra sua identidade moral, ela contorna os problemas, ignora os comentários infundados e críticas maldosas e consegue crescer forte, independente, com valores irretocáveis e com metas firmamente traçadas. Cheguei a conclusão que evoluir é uma escolha e que muitas vezes vai te obrigar a ouvir calado qualquer comentário que magoe ou até mesmo explodir numa forma de aliviar a sobrecarga de inverdades proferidas contra você, fazendo com que sua voz se torne irreconhecível ao ficar trêmula de raiva.

A partir do momento em que se opta por seguir o caminho certo, acredito que é possível sim um homem ser fiel, mesmo que exemplos paternos mostrem uma tendência contrária; ser honesto e íntegro, mesmo que o irmão seja um bandido; ter sucesso profissional mesmo que sua mãe te rotule como fracassada; manter seus valores intactos mesmo que a maioria a sua volta tente seduzí-lo e levá-lo para o caminho errado. A vida é feita de escolhas e quando se percebe que algo está errado, independente dos fatores externos, há como mudá-lo: é só respirar fundo e proteger sua identidade de qualquer julgamento. Escolha viver bem, ignorar o que instintivamente ache que deva ser ignorado e lute, mas lute muito. Não para provar a sua família que ela está errada, mas para ratificar seu poder de escolha e determinação, contrariando todas as expectativas ordinárias. Suas ações podem determinar quem você é na essência a partir desse momento.


quarta-feira, 22 de abril de 2009

Confissões de uma mulher de 30

Durante uma conversa espontânea com uma pessoa muito especial, ontem – prefiro acreditar que essa espontaneidade nada tenha a ver com a garrafa de cabernet sauvignon que decorava nossa mesa (!) –, comecei a prestar atenção na música ambiente do restaurante, “personificada” nos clipes que passavam nas televisões de LCD do local. Ouvi de tudo: Corona com seu “This is the rhythm of the night”; Ace of Base interpretando a deliciosa “The Sign”; Culture Beat com “Mr. Vain”, entre outras pérolas. Percebi que esse repertório, totalmente insignificante para menores de 25 anos, refletia o set do DJ que tocava num aniversário realizado no primeiro andar.

Resolvi perguntar ao garçom quantos anos fazia o tal aniversariante e mesmo sob forte negativa da pessoa que estava a meu lado, acertei em cheio: 30 anos. Recentemente, percebi que tenho o “dom” de identificar uma determinada fase da vida a partir das canções e da moda que me marcaram naquela época. Sabia, exatamente, o que me lembrava essas músicas e qual o ano de cada uma delas, justamente por compartilhar com o aniversariante a mesma idade e, claro, a mesma época a qual me refiro.

Nesse restaurante vivi situações nostálgicas, engraçadas e de muita reflexão e sintonia com a pessoa que estava comigo, que vai “comemorar” seus 30 ainda este ano. Percebemos que estamos passando pela mesma fase, mas de maneiras diferentes. Ele, ao contrário de mim, está caminhando ainda pela estrada da negação. Eu, por outro lado, já me conformei. Confesso que estou até gostando de ser balzaquiana e me sinto exatamente como um dia bem descreveu o escritor: “a mulher de trinta anos pode se fazer jovem, desempenhar todos os papéis, ser pudica e até embelezar-se com a desgraça”, além de se libertar de toda a culpa que um dia carregou. Hoje, como deduzi ontem, consigo dizer ‘não’; corro atrás de qualquer coisa quando quero; e consigo ignorar a opinião de alguns quando não gostam das minhas atitudes.

É engraçado (apesar da palavra “trágico” de ter me ocorrido agora) fazer 30 anos. Parece que estamos perdendo tempo o tempo todo e de vez em quando nos pegamos a analisar a vida e não paramos de nos questionar: “o que fizemos até agora? Nossa! Ainda moro com meus pais! Preciso ganhar dinheiro!”, etc. Pior é quando todas as suas amigas, da mesma faixa etária claro, já casaram ou estão grávidas.

Resultado: esse quadro pra lá de crítico faz com que todos da sua casa se voltem contra você, te obrigando a travar uma batalha sobre-humana consigo mesma e, claro, com a família inteira. Conceitos, critérios, medos e frustrações vem à tona, fazendo com que seu inconsciente se revolte e transmita a mensagem de que você é sim uma adolescente; que você quer sair com pessoas mais novas; aprender novas gírias; e ser suscetível aos modismos recentes. Além de voltar a fumar aquele “gudanzinho” na noitada, fazer aquela figuração na porta da boate mais frenética do momento e gastar rios de dinheiro com vodka e energético, isso porque um belo dia você descobriu que o Hi-Fi já saiu de moda (e da maioria dos cardápios) há mais de 15 anos.

De acordo com a psicologia isso se chama “Síndrome de Peter Pan”, nome dado ao estágio inconsciente no qual você se encontra presa, intensa e profundamente, na utópica Terra do Nunca, paraíso para aqueles que não querem crescer segundo o clássico imortalizado pela Disney. Essa mesma fase de resgate me aconteceu aos 24, quando estava prestes a me formar na faculdade, já tardiamente. Não queria ser profissional de jeito nenhum e o fato de assumir ainda mais responsabilidades na minha profissão me fazia pirar. Superei.

Na conversa de ontem percebi que eu tenho o poder de dar um “basta” em tudo que me incomoda. Foi assim com alguns relacionamentos passados, com o cigarro, com minha primeira crise de identidade e por que não o fazer de novo? Sei que isso está prestes a acontecer. Fato. A única coisa que eu não sei é se estou preparada para comprar agora uma passagem de volta da Terra do Nunca, Shangrilá, Pasárgada, que seja. Pode ser que sim... quem sabe em suaves prestações?

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Quando o corpo fala

Há mais de dois anos resolvi trocar as noitadas de segunda a segunda, um namorado sedentário e o meu doce cigarro para me tornar uma atleta. Nem sei como esse desejo começou. Pode ter vindo depois de uma ida à praia de Itacoatiara, em Niterói, onde a maioria dos frequentadores parece ter saído de uma fôrma perfeita, ou pelo fato de eu ter conhecido uma menina de 20 anos que aparentava 35. Bem da verdade que comecei a fazer atividade física devido à vaidade excessiva que tenho, um dos meus pecados capitais. Logo ia completar 30 anos e o corpo que eu via de biquíni não me agradava. Sempre fui exigente e estava me deixando de lado. Num segundo momento, fui atingida pelo cupido e, quando menos esperava, não conseguia mais viver sem aquilo.

Ainda mais depois que eu conheci um amigo, que me apresentou a escalada, ou alpinismo, como preferir. Quando eu senti meu corpo sendo elevado pelas minhas próprias mãos e pernas, em contato direto com a rocha (além da dor e ardência nas mãos e nas costas) senti uma intimidade que família ou homem nenhum tinha me passado. Estava apaixonada e disposta a viver para aquilo. De boêmia à atleta foi uma grande jornada e ainda é. Deixei o cigarro, que passou a me enjoar, passei a correr frequentemente, passei a sair somente aos sábados à noite (isso, claro, se não houver uma escalada marcada para domingo de manhã) e deixei de comer besteira, para seguir a risca o que me passa o nutricionista. Hoje em dia, não consigo viver sem minha rotina: acordo às 5h15, malho às 6h, vou trabalhar e, dependendo do dia da semana, treino, à noite, corrida ou escalada num muro (indoor).

Mas uma coisa que todo atleta deve ter em mente é que não se deve testar o limite do seu corpo, por mais que seja algo inconsciente ou inerente a qualquer vontade própria. Pensamos que somos deuses e que nossos corpos são de aço, como super-homens ou, no meu caso, mulheres-maravilha. Isso, claro, até acontecer a primeira lesão. Ela chega de surpresa, geralmente, quando se está no auge do treinamento e do condicionamento físico. Não existe coisa pior pro atleta do que ouvir a seguinte palavra de um médico: "Repouso". Quando ela vem acompanhada de "absoluto", chame um cardiologia porque é bem capaz que além da contratura muscular o atleta tenha um infarto.

Ficar sem fazer nada ou se sentir limitado ao fazer uma atividade física é um sofrimento sério para alguém que tem o esporte como um pilar em sua vida. É o meu caso. O esporte para mim é algo que levo muito a sério, a ponto de ignorar a dor aguda que tenho sentido no peitoral há semanas, com medo de ser algo mais grave do que uma contratura muscular. Nosso terror é o chamado estiramento, enfermidade que, definitivamente, não deve ser ignorada. Hoje, enquanto malhava senti meu peitoral explodir por dentro, fazendo com que saíssem dos meus olhos lágrimas involuntárias de uma dor que me fez parar de respirar por segundos. Dor que eu, infelizmente, não consegui desprezar.

Fui socorrida por amigos que me levaram a uma clínica. Resultado: estou com uma lesão no músculo peitoral maior, por conta disso estou tomando medicamentos indicados pelo ortopedista e ainda tenho que fazer exames na próxima semana para detectar, ao certo, qual o tipo de lesão. Mas segundo meu nutricionista, estou com princípio de overtrainning. Mantenho a todos informados quando descobrir exatamente o que é. Como todo atleta, apesar de ter ficado de cama hoje, amanhã vou acordar às 5h15, malhar às 6h e depois vou trabalhar. Fiquem calmos... amanhã é dia de posterior de coxa e vou ignorar dessa vez, não a dor, mas sim os exercícios para tríceps e peitoral... que fazem parte dessa série (que ironia!).

Agora a pouco, ao me permitir deixar a raiva e a revolta de lado, por ter sido tão cega comigo mesma, vejo que estou aprendendo que vale muito mais a pena ouvir quando seu corpo fala do que viver o resto da vida sem praticar as atividades que mais ama. A verdade é que vale muito mais a pena ficar uma semana parado do que cinquenta anos. Sinceramente, espero ter aprendido isso dessa vez e que num futuro longínquo eu me esforce a repousar quando for preciso, porque eu não consigo imaginar minha vida sem o esporte.



domingo, 12 de abril de 2009

Páscoa em família (?)

Na Revista O Globo de hoje (12/04/2009) tinha um texto maravilhoso do Xexéo, falando sobre as tradições de se comemorar a Páscoa com bacalhoada e ovos de chocolate. Identifiquei-me tanto com o texto tão honesto e direto do "coleguinha", que parei para pensar em como a minha família comemora. Ela é pequena: em casa somos somente eu, meu irmão mais novo e meus pais. Seja em qualquer tipo de data considerada importante por famílias grandes e tradicionais, como Natal e Páscoa, minha família não faz absolutamenta nada.

Acho que a nossa tradição (que assim como outros paradigmas esse eu romperei também) é não comemorar ou celebrar absolutamente nada. Após a infância, ano após ano eu, hoje uma mulher adulta e frustrada, me engano. Na Páscoa, por exemplo, quando não viajo (já que minha família permite isso), faço questão de acordar cedo e distribuir meus ovos de chocolate, buscando alguma reação. Mas nada acontece. Minto. Por milésimos de segundos surgem sorrisos e abraços de agradecimento, mas depois... nada.

É triste presenciar que os homens da família ignoram por completo os esforços da minha mãe em manter viva a tradição da Páscoa e seu real significado e o meu em comprar ovos para todos e tentar sair para almoçar, para rir, falar do dia-a-dia e esquecer um pouquinho dos problemas que rondam qualquer família de classe média. Quanta inveja tenho (sei que é feio, mas prometi não me tolir em meu próprio blog) das famílias grandes que se esforçam para se manterem unidas a cada dia e que fazem da Páscoa uma celebração do carinho que sentem uns pelos outros.

Xexéo, em seu artigo, diz que em algum momento de sua juventude seu pai tentou criar alguma imagem da Páscoa, comprando-lhe ovos de chocolate. Após seu falecimento, sua mãe assumiu seu posto e começou a preparar um risoto de bacalhau. Atualmente, com sua família, o jornalista mantém viva a tradição, criada com esforço e altruísmo por seus pais, fazendo o tal risoto e comprando chocolate para todos.

Penso que meu destino possa ser esse: reavivar o sentimento de solidariedade, amor e esperança que provém da Páscoa com muita alegria em minha futura casa, com a minha futura família, apesar de não ser católica. Confesso que hoje já perdi as esperanças de tirar meu pai da frente da TV ou do computador e meu irmão dos braços de Morfeu. Ainda assim, vou insistir num possível erro e ainda gastar, no próximo ano, algumas centenas de reais com mais ovos de Páscoa e com um almoço ao lado da minha mãe.


Tradição X Tecnologia

Minha avó sempre me contava sobre sua infância e como os jovens tinham e demonstravam respeito pelos mais velhos. Falava ainda sobre os costumes de sentar à mesa pontualmente às 18 horas para jantar com toda a família, assim como dormir até às 20h30, sem poder passar desse horário uma única noite, principalmente se no dia seguinte tivesse aula de manhã cedo. É engraçado como a cada dia que passa, mais eu me lembro do que dizia a minha avó, mesmo porque pouco tenho lembranças de sentar à mesa com meus filhos para conversar, rir e falar sobre a vida.

Pode-se dizer que a instituição “família” mudou muito nos últimos 100 anos, em parte por conta do advento da tecnologia que seduz e, a cada inovação, vem seduzindo alguns ou todos os seus membros. Tamanhas são as distrações (sejam elas para fins profissionais ou apenas para alimentar a curiosidade) que impedem a família pós-moderna de arrumar um tempo para si mesma e para digerir seus conflitos mais latentes, que agora vem se agravando por conta da falta de comunicação.

Atualmente, não sobra mais tempo de ligar para um filho, só para saber como ele está, de perguntar à nossa mãe se ela tem seguido os conselhos de seu médico e se tem dormido bem à noite. Ao que tudo indica, o século XXI será conhecido como o das grandes inovações tecnológicas, mas também do distanciamento familiar.

Hábitos simples como ler o jornal pela manhã se tornou algo inacessível ou uma verdadeira batalha para alguns. Isso porque nossos filhos preferem ler as notícias através dos onlines e nossas filhas “roubam” de nós as editorias de moda e cultura a caminho do quarto, onde se trancam. Nossos maridos... esses então, ficam cada dia mais imersos em seus livros de história ficcional, fugindo da realidade, ou desvendando as inúmeras facetas dos joguinhos de computador, muitas vezes, estes apresentados por nossos próprios filhos.

O “bom dia” se transformou num grunhido pela manhã seguido de um vulto que sai direto pela porta da sala, o “boa noite” às vezes é inexistente (o que nos faz sentir falta do grunhido) tamanha a diversidade dos horários de chegada e saída da família. Apesar dos amigos do msn (quase sempre online) ou das atualizações do orkut valerem mais a atenção dos jovens e adultos (!) do que sua própria família, acho que as inovações tecnológicas não devem carregar toda a culpa desse distanciamento.

Faz parte da família pós-moderna identificar e compartilhar grunhidos, que com o tempo podem se transformar em frases, por consequência, em diálogos e por aí vai... assim como falar sobre um fato do dia-a-dia, mesmo que seja somente para desviar o olhar do outro que está compenetrado sobre a tela do computador. É importante saber que é possível fazer sim com que a família evolua unida, abraçando a tecnologia, mas respeitando as tradições formadas e exaltadas por nossos avós.